Walter Medeiros
Natal
de cem anos atrás experimentava uma evolução lenta, mas ampliava-se através de
certa estruturação proporcionada pelas suas vias de transporte terrestre,
fluvial e ferroviário. Sua população de menos de 30 mil habitantes
movimentava-se no dia a dia da Ribeira, Cidade Alta e outros poucos bairros.
Ali localizavam-se as principais atividades de manufatura, indústria e
comércio.
Rostand
Medeiros, em trabalho de pesquisa sobre propaganda antiga em Natal registra que
há pouco mais de cem anos a cidade tinha uma vida tranquila, onde o povo ainda
andava no lombo de animais e havia vários jornais para dar conta de tudo.
Inclusive da chegada de navios – a mais importante forma de locomoção para
longe da terra potiguar: vapores de cargas e passageiros. Quem ia para o
interior, o jeito era o trem, ou em lombo de animais.
Para
melhorar o acesso entre Natal e o interior do estado, bem como ligar o lado sul
da cidade à zona norte, foi construída a ponte de ferro de Igapó. A obra foi
inaugurada em 20 de abril de 1916, e constituía-se de uma via para automóveis e
linha férrea. Totalizava 550 metros, com nove vãos de 50 metros e um de 70.
Meu
primeiro contato com a ponte de Igapó se deu em 1962, quando, aos nove anos,
voltei para Natal no trem que vinha de Arco-Verde, Pernambuco, depois de chegar
até lá num caminhão que nos levara de Mata Grande, alto sertão de Alagoas,
cidade onde moramos durante seis anos. Tudo era novidade para mim.
Para
passar pela ponte de Igapó, o trem gozava de total prioridade. Assim, passamos
direto e seguimos pelas Quintas, Guarita, rua Ocidental, Paço da Pátria e
estação central da Ribeira. Ali embarcamos num buíque preto que nos levou até a
rua Campo Santo, no Alecrim, onde lembro bem da recepção calorosa e amável dos
meus avós, Francisco Bezerra e Constância Medeiros. O primeiro agrado da minha
irmã foi me dar um poli, que até então eu conhecia como picolé.
Tempos
depois fiz a primeira passagem de carro pela ponte de Igapó, quando então
entendi o método utilizado para alternar a passagem dos veículos e o trem. Cada
margem da ponte tinha um funcionário com bandeiras vermelha e verde, usadas
para autorizar a passagem, o mesmo tão utilizado em obras de rodovias quando a
passagem fica limitada a uma só via.
Oito
anos depois daquela viagem de trem, lá vamos nós para a ponte de Igapó. Natal
inteira na rua, seguido a pé para ver o monsenhor Walfredo Gurgel inaugurar a
primeira ponte de concreto, que mudou completamente a situação, facilitando o
tráfego entre as margens do rio Potengi. Mas a cidade continuava crescendo cada
vez mais acentuadamente. E em 1989 lá estávamos novamente na ponte de Igapó,
daquela vez para assistir o governador Geraldo Melo entregar a terceira ponte
paralela sobre o rio Potengi, a nova ponte de Igapó.
Uma,
outra, ou todas aquelas pontes me marcaram tanto, que nas minhas idas e vindas
para a casa da minha mãe, no conjunto Panatis e atividades comunitárias ou
visitas aos amigos, resolvi criar um jornal para noticiar as coisas da Zona
Norte. Nome do periódico mensal: “A Ponte”.
Muitas
histórias importantes e belas foram contadas nas páginas daquele jornal, que
circulou por cerca de dois anos, com patrocínio de comerciantes e prestadores
de serviços locais, e distribuição gratuita. Até que numa crise de falta de
papel jornal a gráfica do Diário de Natal não podia mais executar a impressão.
Tivemos de buscar uma alternativa. Os preços eram astronômicos e impraticáveis.
Nada mais podia ser feito, e assim “A Ponte” encerrou sua trajetória.
Neste
momento em que completa cem anos de inauguração, a ponte de ferro de Igapó,
testemunha de todas essas histórias, merece uma atenção especial da sociedade
natalense e do poder público. Sabemos da destinação que foi dada à sua
ferragem, mas sua estrutura é algo que deveria tornar-se um símbolo mais forte
de Natal. É hora, portanto, de incorporar aquele ponto à vocação turística e
histórica de Natal.